dantes, se estudasses afincadamente ou assim-assim, tinhas um emprego esfalfado, feito de recibos verdes, avenças quando deus quer, bolsas de tirocínio, e um dia a vida encarreirava-se
agora, mesmo que estudes esfalfadamente, até podes ter diploma de médico, de leis ou de engenharia, mas vais sair com ele à cata de uma caixa registadora onde não vasculhem as habilitações, para conseguires trabalho.
e com um bocado de sorte grande, passas umas dúzias de horas a arrumar mercearias em paletes e estas no armazém, para trazeres um ordenado mínimo regular. e a vida descarrila nesse caminho.
dantes, havia uma coisa que te protegia na vida laboral, chamada leis do trabalho, e outra coisa que funcionava, chamada inspeção
e havia uma entidade pouco ruidosa mas que servia para pôr patrões em sentido - chamava-se sindicato - que impunha uma coisa chamada contrato coletivo de trabalho, e nele fazias finca pé.
agora, contas os dias que faltam até ao fim do mês para saberes quantos salários em atraso faltam para ires até ao iefp nas apresentações quinzenais - obrigação que partilhas com os suspeitos de crime que cumprem termo de identidade e residência.
não há a mais pequena expectativa de que algo mude: à boca cheia todos te aconselham a que te mudes - que emigres, pois.
no rame-rame dos dias, não sei como ainda não espetaste um balde de tinta no senhor desgoverno.
AS MULHERES TÊM TODAS UM PONTO DO CORPO, UM RECANTO DA CIDADE, UMA HORA DO DIA, QUE SÃO NELAS COMO QUE UMA PORTA SECRETA, PELA QUAL PODEM SAIR DE SI PRÓPRIAS, DA SUA TIMIDEZ, E PENETRAR EM TODA A ESPÉCIE DE LOUCURAS, GRAVES OU VENIAIS.[Erik Orsenna]
terça-feira
segunda-feira
quinta-feira
uma tristeza pequenina, persistente, incómoda, como a chuva morriña.
um vazio sem norte, como o desgosto profundo
uma incerteza fina, como o golpe de navalha
o tempo também nos dá isso: a imobilidade no pensar, nem sequer é reflexão, ponderação,... é só mesmo não saber o que pensar, como agir.
e outra vez, a tristeza morriña e o vazio a pesar pesado.
um vazio sem norte, como o desgosto profundo
uma incerteza fina, como o golpe de navalha
o tempo também nos dá isso: a imobilidade no pensar, nem sequer é reflexão, ponderação,... é só mesmo não saber o que pensar, como agir.
e outra vez, a tristeza morriña e o vazio a pesar pesado.
porque me apetece dizer isto, com Drummond
Definitivo, como tudo o que é simples: nossa dor não advém das coisas vividas, mas das coisas que foram sonhadas e não se cumpriram.
Por que sofremos tanto por amor? O certo seria a gente não sofrer, apenas agradecer por termos conhecido uma pessoa tão bacana, que gerou em nós um sentimento intenso e que nos fez companhia por um tempo razoável, um tempo feliz.
Sofremos por quê? Porque automaticamente esquecemos o que foi desfrutado e passamos a sofrer pelas nossas projeções irrealizadas, por todas as cidades que gostaríamos de ter conhecido ao lado do nosso amor e não conhecemos, por todos os filhos que gostaríamos de ter tido junto e não tivemos, por todos os shows e livros e silêncios que gostaríamos de ter compartilhado, e não compartilhamos. Por todos os beijos cancelados, pela eternidade.
Sofremos não porque nosso trabalho é desgastante e paga pouco, mas por todas as horas livres que deixamos de ter para ir ao cinema, para conversar com um amigo, para nadar, para namorar.
Sofremos não porque nossa mãe é impaciente conosco, mas por todos os momentos em que poderíamos estar confidenciando a ela nossas mais profundas angústias se ela estivesse interessada em nos compreender.
Sofremos não porque nosso time perdeu, mas pela euforia sufocada.
Sofremos não porque envelhecemos, mas porque o futuro está sendo confiscado de nós, impedindo assim que mil aventuras nos aconteçam, todas aquelas com as quais sonhamos e nunca chegamos a experimentar.
Como aliviar a dor do que não foi vivido? A resposta é simples como um verso: Se iludindo menos e vivendo mais!!!
A cada dia que vivo, mais me convenço de que o desperdício da vida está no amor que não damos, nas forças que não usamos, na prudência egoísta que nada arrisca, e que, esquivando-se do sofrimento, perdemos também a felicidade.
A dor é inevitável.
O sofrimento é opcional."
(Carlos Drummond de Andrade)
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