segunda-feira

vazio*

(...)sei como isto se cura. porque para todas as maleitas há um remédio - a questão é acertar com ele; às vezes nem é dispendioso, nem está longe, nem é assim tão surpreendente. mas um remédio, quando se sofre, é o bálsamo que qualquer alma merece. pode cozinhar-se com pouca coisa: dias de solidão extrema, um silêncio sepulcral, uma névoa dos céus, o vazio no pensamento, parcas rações, menor disposição para o trabalho e vagas utopias. conquanto isso resolva o problema, de forma rápida e tão indolor quanto possível, ... até que há quem passe bem pior! alegremo-nos pois!, nem com programas de tevê, nem com romances dos que nos sequestram na leitura até ao fim, mas com o vazio absoluto, o não ter nada, não desejar nada, não pensar nada se possível.
é, todavia, difícil sobreviver assim porque nenhum capítulo desta bula nos diz como se doseiam as emoções, afinal o princípio e o fim de tudo.
no ar fica a sensação do início do caminho. fazes apelo ao positivismo, dizes que será algo melhor - até porque vivemos com pouco, desejamos pouco, consumimos pouco, mas temos muitos sonhos, e não trapaceamos nada...
[os que não acreditam que um ente superior determina a sua vida só podem crer em si, pelo que amanhã será o que começares hoje]

* in
//icebergueaderiva.blogspot.com

1 comentário:

jmf disse...

Disseste-me há dias que não tinha percebido nada do outro texto. Imprimi-o e andei com ela pela China, li-o vezes sem conta, tenho-o na mochila, no gmail, no mail do jornal… (afinal, não era preciso, não o apagaste e o Sitemeter dar-te-á um preciso e obsessivo roteiro de leitura num fuso horário exótico), e, sim, acho que continuo a não perceber. Não percebo que caminhos começaste a trilhar, em silêncio, há tantos meses. Ou melhor… percebo claramente: embora tu escrevas outras coisas, tudo se resume ao amor que já não me tens. Procuras a paixão, um reinício sem mim. Ainda não percebi se já me odeias, se me desprezas, mas temo que lá cheguemos.
Eu tinha idealizado tudo diferente para nós, coisas de filmes, de casais que criam filhos, se desgastam na monotonia da vida – os filhos-da-puta dos empregos… -, mas ganham maturidade e se redescobrem uma e outra vez. E o amor – se calhar a paixão, vai e volta, dá-nos novos fôlegos. Tinha sonhado para nós, acima de tudo, a serenidade. Que não vejo em contradição à paixão.
Volto à surpresa – construiste, nos últimos meses, um mundo teu, onde eu já não existia. A minha estupidez foi essa. A desatenção. E tu agora dizes, e podes dizer, que garantias te podia eu dar de que caminhávamos para essa serenidade – em que nos poderíamos apaixonar, acho eu – se em 22 anos, metade da nossas vidas, lembras tu, houve tanto desencontro. Mas houve tanta gargalhada, tanta pequena e grande felicidade, tantas rotinas doces.
E eu, eu sei, só já te podia fazer promessas. Acho que também é isso a paixão, acreditar que é por ali. Tu já não acreditas em mim. Já nada posso fazer. Se há um derrotado nesta história sou eu, que fui apanhado de surpresa por uma decisão tua com a qual não concordo – por mais espaço/tempo que queiras para ti, esta casa, eu, podemos dar-to. Era possível recomeçar a dois. Mas, já me esquecia, tu não me queres é a mim.
Ando aos caídos, aguentando-me com ilusões. O trabalho, a casa, os miúdos... Vou ficar seco. Se já era como era, temo ficar irreconhecível. Ao contrário de ti, não vou procurar nada, não vou desejar que me aconteça nada, o que queria procurar era contigo. Tu sempre foste aquilo que eu não conseguia ser, mais forte, mais determinada, mesmo quando fingias desorientação era só para me dar o papel da escolha. Acho que sem ti não me teria aventurado numa série de coisas e tu sabes disso. Vou ficar aqui, a dobrar meias e tentar não chorar em frente aos nossos filhos – nem sempre é fácil, se algum deles me visse agora… Ia a dizer que ficava à espera. E só podia ser à tua espera – como tu, perdi as regras da atracção, mas, ao contrário de ti, não tenciono procurá-las. Fico por aqui, a perder o melhores anos da minha vida, a envelhecer, triste. Temo que venha a ficar azedo, zangado com o mundo, eu que era o optimista permanente. Mas eu – desculpa o egoísmo - também não merecia isto, por muito que tu também não merecesses o ponto a que chegaste.
As próximas semanas vão dar comigo em doido – querer dormir e não conseguir, querer respirar e não conseguir, abrir janelas que só me trazem o frio metefórico e real, sempre de telemóvel ao lado, não vá surgir a mensagem que sei impossível. Tenho muitas, tantas, imensas saudades tuas. Não sei se é possível pensar tanto em alguém e sobreviver, atinar com as coisas pequenas da vida.
Não era isto que eu queria da vida – não me voltes a dizer que gosto da solidão, quando vim estudar para Lisboa passei noites em branco a chorar, só -, eu queria uma vida ao teu lado.
Amo-te muito Luísa. Sei lá se é paixão, quero cá saber dos nomes. Só sei que queria agora o teu olhar. Curiosamente, nem é do sexo que sinto mais falta – eu não disse que não sentia falta – é da tua presença, do tua pele, do teu carinho, da tua voz.
Agora vou para a cama, com mais um comprimido para dormir, sentir a tua falta, o silêncio sepulcral, a impossibilidade de alguém que se aninha, de um braço que me abraça, de um beijo na nuca. De alguém a quem chame fofinha, com quem queria viver mais 22 anos, conhecer mundo, partilhar ideias, escrever coisas em conjunto, fazer planos para a casa (a nossa casa…). Nada disto faz sentido sem ti. Nada disto faz sentido. Nada.